este é "a a z", um poema sobre os encontros e desencontros de um relacionamento amoroso.
de A a Z, quantas letras falam sobre mim
quantas letras falam sobre você?
e se as letras falassem, seriam elas letras ou sons?
e se fossem sons, será que seriam bons
ou soariam como johnny cash imitando neil young
enquanto na plateia ninguém entende nada
e a pergunta fica solta no ar, sem resposta: e aí, é bom?
o nosso disco tá arranhado e é por isso que falo disso
enquanto o coloco na vitrola e a música que toca
parece ter mais letras do que os ouvidos sabem ouvir
eu apertaria pausa, se nas vitrolas existisse pausa,
só pra poder procurar no dicionário
o que é que o nome dessa tal rosa de hiroshima quer dizer
se é rosa ou se é mulher e se nasceu mesmo em hiroshima
e o que acontece com ela depois que alguém a colhe
e o que acontece se ninguém a escolhe
e se aquela bomba nunca cair
do que é que a gente vai chamar as rosas dali?
tem a chance, a pequena chance, de que o nome seria
o mesmo que damos a todas as outras rosas
mas quem aqui sabe das coisas?
quem aqui escreve prosa chamando rosas
de um nome que não seja um nome que não se dá às rosas?
quem é louco, quem é frouxo, quem sabe tão pouco da vida
que já não conhece esse beabá, que já não suspeita
que o disco arranhado é só uma metáfora
pro que a gente vem guardando dentro do peito
ou no criado, ou dentro da caixa cheia de cartas
ou escondido embaixo das reservas pagas daquele hotel em praga?
são os nossos votos quebrados, os reflexos no espelho
os olhares enviesados enquanto eu tomo café
e você se arruma pra mais um dia de trabalho
tão linda quanto da primeira vez que te vi
eu queria ter forças pra continuar aqui só pra saber
se você vai continuar tão linda assim na última vez que eu vir você
se aquele alfabeto que fala sobre mim e sobre nós
se todas as letras e sons e rosas e o neil young
serão suficientes pra escrever a minha parte da história
ou se de A a Z eu vou ser nada mais que um A à esquerda
e as nossas vidas voltarão a ser como já foram um dia
duras e ásperas e cheias de fúria, contidas e frias
alfabeticamente trancafiadas em palavras que a gente não disse
um abecedário de esperanças vencidas
que nossos tantos As e Zs conseguiram tornar azedas.
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